Sunday, April 15, 2007

Tou-te a micar ó Maior!

Uma das coisas que tenho aperfeiçoado aqui em Amesterdão é a minha capacidade de intuir a nacionalidade das pessoas com quem me cruzo, ou vou falando, sem que eles me precisem de dizer. E é giro, porque me parece que numa cidade destas, esta capacidade é generalizada e toda a gente desenvolve a intuição de perceber a nacionalidade, ou pelo menos a parte do mundo, das pessoas com quem se cruza.

Claro que a capacidade não é igual em todos os casos. Ou seja: eu não consigo perceber se o Mohamed do lado é do Libano ou do Irão mas consigo perceber se um qq pintas é espanhol ou fraçu, ou italiano, ou português MESMO que não abram o bico. Mas o engraçado é que é mais fácil do que o que parece, e eu não sabia que tinha esse fabuloso poder.

No caso dos portugueses, então, mico-os em menos de 1 segundo. Há qualquer coisa no olhar lusitano que é imediatamente acusador da proveniência. Um olhar naturalmente curioso, elástico, rápido, comunicativo, ou, quando devidamente alcoolizado, disperso, introspectivo, profético até, pensando num qq verso de Fernado Pessoa do tipo "Falta Cumprir-se Portugal" enquanto os strobes de uma discoteca lhe iluminam e queimam a face erguida, e o atiram para um qualquer dia de verão nas praias do Alentejo... Ou isso, ou um verso mais popular do tipo "O que tu gostas sei eu" olhando de soslaio para um loira qualquer que dança mais depressa que qualquer descendente de viriato consegue piscar os olhos... "Oh diabita loira" - pensa - "dança dança que logo vês os brandos costumes...".

Bem: mas imediatamente tira-se a pinta. O tipo é tuga!

Claro que há outras coisas que ajudam: um bom tuga tem sempre uma camisinha de marca, ou um sapatito de vela. Um bom tuga insiste em usar a t-shirt da throtleman que tem um boneco que só os portugueses acham piada. Eu por exemplo, tenho várias! E uso-as de facto, como bom português que sou.

Aliás, uma vez quando estava no instituto, e perante o inglês martelado da t-shirt, um americano que lá estava perguntou-me: "oh maior, isso que está ai é inglês?" E eu olho para minha t-shirt, e o tigre qe lá estava, jingão, de óculos escuros e vestido de bermudas dizia de facto "I will put you some cream" num cenário balnear. Perante a pergunta, fiquei a percber que tinha uma t-shirt que dizia um grande bacorada, como muitas que os portugueses usam... E como bom português, também me saiu logo a resposta, e disse, de imediato, como que sacando da vara de campino:

"Oh menaço!" - como ele é americano trato-o por menaço - "tu não estás a ver... Isto é uma piada a um tuga que é o terror do Algarve... O tipo é o devorador de inglêsas e consegue isso, sem sequer falar inglês: manda bitaites destes e lá consegue o que quer. O gajo não é um poeta, mas é prático. É um hell raiser do caraças!!"

E rio-me! Ahahah!

Mas rio-me sozinho.

Eles não perceberam mas ficaram esclarecidos acerca dos portugueses... E eu também! É que o bom português tem como idolo o grande Ze Zé Camarinha: o tigre comedor de bifas!

Bem, mas relativamente a esta capacidade vejo que não é exclusivamente minha, e os outros tugas, turistas ou não, também percebem que eu sou tuga. Aliás, há sempre aquela cena ridicula de eu olhar para um gajo que me parece tuga, e o gajo nesse momento olha para mim e vejo pela expressão que o gajo está a pensar o mesmo que eu.... É do caraças!

Mas ai surge uma coisa muito engraçada, e também muito reveladora do carácter dos portugueses. Há, quase de imediato, um apelo a cumprimentar o outro português. E surge essa vontade forte como um instinto da natureza... Mas exactamente ao mesmo tempo pensamos os dois:

"eh pá, eu não vou estar aqui a cumprimentar um gajo só porque é português. Que coisa mais de provincia!! E nós portugueses somos um povo do mundo, espalhado por todo lado, e portanto não somos de provincia. Fomos nós que descobrimos o mundo todo no tempo daquele gajo... como é que ele se chamava... ai como era?.. Foda-se! Não interessa: vou é ignorar o tuga campónio, que eu não sou desses..."

E ignoramo-nos mutuamente, ignorando também que isso só demonstra o nossos vários complexos tipicamente lusitanos. O acordo tácito de altivamente ingorar o outro é, aliás, a prova final que se trata mesmo de um português!! Muito fixe...

Mas uma outra coisa que isto revela é que EU tenho mesmo cara de tuga. Em tempos, os meus olhos azuis e o cabelo claro ainda me valiam alguma distinção entre os colegas mais morenos da escola. Ainda ouvia coisas, que me deixavam a sentir de certa forma especial, do género:

- "oh Canhoto! Sabes uma coisa, pá?"
- "Não oh maior: diz..."
- "Tu com essa cara até pareces estrageiro, sabes? Grande estilaço, oh méne!"
- "Estrangeiro, pá?" - e perguntava, curioso - "De onde, maior?"
- "Oh pá: não se tá mesmo a ver pá? Lá de fora, pá! Lá de fora!..."
- "Ei.. Tou a ver pá! Muito fixe!..."

E ficava orgulhoso com esta distinção. Mas agora percebo que não, que afinal tenho cara de tuga como todos os outros. Mesmo! Sou um tuga típico e não sabia. O pior é que a autoconfiança masculina baseia-se em coisas muito estupidas, e esta era uma das bases da minha auto-confiança. Vim para aqui, e puxam-me o tapete. Mas não fica por aqui...

A outra coisa em que alguns homems baseiam a sua auto-confiança é na altura. Sim, porque 1.87m em PT é bastante: consigo ver a discoteca da ponta à outra. É um sensação de poder porreira. Sou verdadeiramente o maior... Ou o segundo ou terceiro maior, o que também não é mau.

Contudo, pelas últimas estatísticas que consultei, os holandeses são o povo mais alto do mundo... E se é estranho haver gajos mais altos que eu, é muito mais estranho ver miudas, com pouco mais que metade da minha idade e com mais 10 cm que eu. E não são uma nem duas!

Aqui sinto-me mesmo pequenino...

Zezé Camarinha: és o maior e eu preciso de conselhos teus!!! Plese ajudate this poor tuggy! :)

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